
Há pessoas que sentem a doença como uma ameaça tal que, mesmo quando não têm uma doença, têm medo constante dela. A Alopatia também tem essa visão da doença. A doença é algo ruim, vem do exterior e precisa ser combatida.
Saúde
Este é um espaço destinado a informações, conhecimentos e reflexões sobre saúde x doença, buscando entender o olhar das diversas práticas médicas, avaliando assim de que forma pode ajudar - ou atrapalhar em nossa busca pessoal pela saúde plena. Precisamos, de forma o mais consciente possível, avaliar nosso papel diante de nosso equilíbrio e harmonia. A Cura é uma jornada pessoal, permanente e intransferível. Que tudo o que aqui venha se dispor possa auxiliar cada um a realizar sua própria jornada. Saúde a todos!

Pontos de vista sobre a doença
Doença como processo de ´desgaste pelo tempo´: Essa é a primeira concepção da doença, a maneira como é considerada amiúde na medicina convencional. O ser humano se desgasta como uma máquina. De tempos em tempos, precisamos repor as partes desgatadas. Essa visão da doença como um processo de desgaste se corresponde bem com a visão mecanicista do universo. Essa visão não é estranha. Todo mundo envelhece, torna-se mais fraco e, eventualmente, morre. Mas, esse ponto de vista tem alguns problemas. Não é fato que o corpo humano é constantemente renovado e consertado? Assim, não está claro como e quando o processo de desgaste triunfa sobre a capacidade de conserto. Esse dilema está claramente representado no seguinte exemplo: Uma mulher idosa vai ao médico com dor no joelho direito. O médico olha o joelho e afirma de modo tranquilizador... ´Não se preocupe. É só um pouquinho de desgaste por causa do tempo´. A mulher reage, respondendo: ´Tudo bem o senhor falar isso, mas minha perna esquerda é igualmente velha e não tem nada de ruim!´.
Doença como ameaça: Algo não está bem, inclusive, a morte pode estar aproximando-se. No nível interior, a doença é frequentemente sentida dessa maneira. Há pessoas que sentem a doença como uma ameaça tal que, mesmo quando não têm uma doença, têm medo constante dela. A Alopatia também tem essa visão da doença. A doença é algo ruim, vem do exterior e precisa ser combatida. As bactérias e vírus devem ser mortos, custe o que custar, porque ´são eles, ou eu´. Na doença como ameaça, a idéia central é que você tem que se defender de todas as influências negativas do exterior.
Doença como estado original: Hahnemann também chama a doença de um ´estado de ser´ ou um modo de ser e de viver. A situação original exterior é, então, ligada a um estado interior de ser. O estado interior é, assim, uma reação adequada a certa situação no ambiente. Nesta perspectiva, o estado é, então, uma reação excelente ao estado do ambiente. O problema é que essa reação pode ser exagerada ou pode persistir mesmo depois que a situação original desapareceu. A reação inicialmente útil é mantida, porém agora se torna inútil e, portanto, é uma perda de energia. Com tudo isso se torna claro que, na Homeopatia, a causa da doença no nível da sua raíz é de grande importância. A situação em que a doença se origina é muito importante para poder entedner o doente e a doença.
Doença como talento ou estratégia: A doença pode representar uma habilidade para manipular o ambiente, o que pode também ser chamado de estratégia, estratégia esta que funciona excelentemente em certas situações, a fim de obter o maior proveito possível. É o lado ´positivo da doença´. Esses padrões de reação são possibilidades, talentos, habilidades para resolver situações. Aqui, novamente, o problema não é o talento, mas o fato de que você não mais pode reagir de qualquer outra maneira e, assim, tornar-se um incômodo. Olhando dessa maneira, a doença se torna um talento que foi longe demais. Em outras palavras, o talento se volta contra você, como um bumerangue.
Doença como ilusão: Em toda doença há um tema central, algo que o paciente percebe de maneira errada. Se você encontrar tal ilusão num paciente e encontrar essa ilusão descrita na literatura homeopática, então, você pode prescrever sobre essa base. No nosso exemplo, a menina vive com a ilusão de que brigar é algo ameaçador e de que ela será abandonada. Essa idéia, ou melhor dizendo, ilusão, é o tema central de Magnesia muriaticum. Portanto, se alguém tiveressa ilusão, você pode prescrever esse medicamento. Isso também é possível quando a situação original cessou há longo tempo. Ou mesmo, quando a situação original nunca existiu, mas está presente em alguém, meramente, como sentimento ou imaginação.
Doença como tentação: Pode-se, também, enxergar a doença como um vício. Todo padrão tem suas certezas, reações previsíveis e possibilidades. Os padrões imutáveis de reação tornam as pessoas muito previsíveis, tanto para si próprias quanto para os outros. O abandono de um estado de doença pode trazer sentimentos de insegurança. Pode-se ter sentimento do tipo: ´O que vou fazer, então?´ ou ´Quem sou eu, na realidade?´ Igualmente, toda solução de um problema dá a você uma espécie de ´chute´, que pode fazer que você tenda a persistir no mesmo padrão, inclusive em situações em que não é apropriado. Outro ângulo é o benefício que a doença traz. Esse ângulo tem recebido grande ênfase, não só na Alopatia, mas especialmente na Psicoterapia. Há tantas vantagens em adoecer que o paciente não quer melhorar jamais. Há, também, algumas desvantagens. Devido à rigidez do padrão de reação, muitas opções deixam de ser utilizadas. E num determinado padrão de reação, a perda pode ser bem maior do que o ganho.
Doença como proteção: Podemos enxergar a doença como proteção, em relação direta com a doença como tentação. Certa atitude pode segurar um risco ou um temor e, assim, fornecer certa quantidade de proteção. Isso mostra, ao mesmo tempo, o aspecto tentador dessa atitude. Mas, uma certa conduta também pode servir como ´tática de diversão´. Quando você está intensamente ocupado com o seu trabalho, por exemplo, você pode esquecer ou contornar um problema mais profundo, como por exemplo, problemas no seu casamento. Isso, por vezes, parece levar a resultados indesejados no curso do tratamento. O problema na superfície é tratado, mas com isso, o problema subjacente, repentinamente, emerge na superfície com toda intensidade. Ao olhar do paciente, a sua condição se agravou, ao invés de melhorar.
Doença como símbolo: Aqui, uma queixa é enxergada como uma expressão simbólica de um problema psicológico. Essa perspectiva tem sido aceita ao longo de toda a história, como indicado por diversas expressões idiomáticas, ´Isso é um peso nas minhas costas´, ´Ele é uma dor de cabeça´, ´É por dor de cotovelo´, ´Não consigo digerir isso´, e assim por diante. Muitas pessoas referem também esse tipo de sensações. Por exemplo, aparecem alguns problemas na família, e isso dá a você problemas no estômago. Os problemas parecem um grande peso no estômago. Nas queixas mais crônicas, essa perspectiva é mais difícil de aplicar, mas mesmo assim, é possível enxergar todas as doenças como simbólicas.
Doença como fenômeno cultural: Toda cultura tem suas normas e valores. Quando essas normas e valores são excessivamente unilaterais, podem se tornar ilusões. E podem levar a queixas em diversos indivíduos que pertencem a essa cultura. Na cultura holandesa não é ´correto´ mostrar tristeza. Você não começa, subitamente, a chorar, e, em hipótese alguma, em público. Inclusive, no funeral de uma pessoa muito amada, espera-se que você conserve a sua compostura. Isso é um contraste com outras culturas em que as lamentações podem ser ouvidas à distância, e lém do mais, é o ´correto´ a se fazer. Esse padrão, de conservar a sua tristeza dentro de você, é uma doença cultural. Se compararmos os diversos tipos de psicose na Europa e no Japão, verificaremos que há muitos tipos que existem em ambas as culturas. Mas, também, que há muitos tipos de psicose que existem somente em uma delas. Há sempre uma conexão definida com as normas e valores da cultura correspondente.
Doença como mito ou conto de fadas: O problema de uma pessoa raramente é único: você pode reencontrá-lo em muitas outras. Os mitos e contos de fadas são a expressão desse fato. Se alguém reconhecer o seu problema num conto de fadas, pode sentir-se muito profundamente afetado. Alguém que está doente, portanto, participa de certo tipo de problema. Através do mito, estabelece-se uma conexão com a humanidade como um todo. Amiúde, o mito também oferece a solução para o problema e, assim, é uma ajuda real. Por outro lado, você pode dizer que, ao resolver os seus problemas, alguém pode ajudar a humanidade a resolver seus problemas mitológicos.
Doença como criação ou jogo: Finalmente, há a perspectiva da doença como criação. Você pode, então, chamar a doença de ´espiritossomática´, por analogia com o termo psicossomática. Um ser humano cria um certo estado dentro de si próprio e, então, constrói uma situação correspondente ao redor daquilo. Aqui já não podemos mais enxergar as circunstâncias com causa da doença; pelo contrário, o homem que é a causa da sua doença e o criador das circunstâncias. Desse ponto de vista, a responsabilidade volta-se para o próprio homem. Ele próprio se torna responsável por sua doença e por sua situação. Mas, dentro da habilidade para criar uma doença, também se encontra a habilidade para achar uma solução. Nessa perspectiva da doença como criação, termos como ´bem´ ou ´mal´ não mais se aplicam. Tem-se, apenas, todo um leque de estados, criações, com as experiências que lhes pertencem.
Reflexão: Se enxergarmos a doença como um processo de desgaste, então, nada pode ser feito. Você é uma vítima completa daquilo, ´você tem que aprender a viver com ela´. No outro extremo está a doença como criação, o homem é, totalmente, a sua própria causa. As circunstâncias psicológicas, sociais ou físicas não têm influência alguma sobre a situação, porque são parte da sua própria criação.
[1] Jan Scholten. In: Homeopatia e Minerais. Editora Organon.
CURA
O Processo
O corpo humano é um organismo notável que vai a extremos para se proteger e sobreviver. Nossos vários sintomas são indícios desse processo, e nossos diferentes sintomas representam diferentes níveis de defesa de que nosso corpo lança mão, sincronicamente no seu esforço para sobreviver. A partir do pressuposto básico de que o ser humano vive em três níveis de experiência – físico, emocional e mental, os homeopatas observaram uma hierarquia previsível que se verifica na cura de qualquer doença crônica.
Certos sintomas de cada categoria, dependendo de sua intensidade, representam uma carga mais grave do que outros para o sistema defensivo. A hierarquia é relativamente óbvia e pode ser descrita aqui de forma simplificada:
a).Nível físico : uma erupção na pele, por exemplo, não é tão séria quanto uma doença cardíaca;
b).Nível emocional : uma irritabilidade pequena é mais superficial que uma forte raiva, e um medo intenso da morte representa um estado mais profundo e mais grave de doenças que os outros dois;
c).Nível mental : uma memória ligeiramente fraca é relativamente menos importante comparada a um estado geral de confusão mental, que em si é menos significativa que um estado esquizofrênico totalmente desenvolvido.
A profundidade real de um sintoma individual, em termos de saúde da pessoa, é determinada por sua gravidade, freqüência e grau de impacto na limitação da sua liberdade de ser e agir de acordo com seu potencial. Assim qualquer sintoma físico grave ou persistente pode ser considerado uma doença mais profunda do que os sintomas emocionais ou mentais, se ameaçar a sobrevivência básica ou tornar muito difícil o ato de viver.
Constantine Hering, o ´pai´ da homeopatia americana, foi um dos primeiros observadores a registrar as formas específicas de acordo com as quais a cura se processa – LEI DE HERING:
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O corpo humano procura externalizar a doença; desaloja-la de níveis mais graves e internos para níveis mais superficiais e externos; uma pessoa com asma pode desenvolver uma erupção de pele como processo de sua cura;
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A cura caminha no corpo de cima para baixo. Assim, uma pessoa com artrite em muitas juntas geralmente sente alívio primeiro na parte superior do corpo e depois na inferior;
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A cura se verifica na ordem inversa do aparecimento dos sintomas. Assim, os sintomas mais recentes geralmente são os primeiros a serem eliminados. Por essa razão, no processo de cura, a pessoa às vezes pode sentir novamente sintomas que sentia anteriormente ao processo de cura(geralmente os sintomas que foram suprimidos).
É desnecessário dizer que os homeopatas recebem com prazer a informação de que um dos velhos sintomas possa ser irritante, os homeopatas evitam suprimi-los. Em geral, só são experimentados por um curto período, e quando tornam a desaparecer, o indivíduo usualmente passa a gozar de um nível de saúde significativamente mais elevado.
Natureza da Moléstia
O que é Vida?
Movimento contínuo, incessante de composição e decomposição que se passa no interior dos tecidos do ser vivo colocado em um meio conveniente. Assim, todas essas combinações que se passam no âmago do nosso corpo entre os elementos dos nossos tecidos e os materiais nutritivos que neles penetram são móveis, instáveis e contínuas. Elas são físicas e químicas em sua forma, mas se fazem e se desfazem por uma causa superior, que não é física nem química.
É nessa causa superior, neste ´impulso estranho´, contínuo, incessante, que está o mistério da VIDA. A Vida é uma contínua adaptação do organismo ao meio. Quando essa harmonia existe, diz-se que há saúde, quando ela deixa de existir, diz-se que há moléstia. A moléstia, pois, como a saúde, tem sua sede na força vital. Só há, realmente, uma moléstia, e a que resulta da alteração ou desarranjo da vitalidade ou força vital.
A moléstia é, portanto, uma desordem vital da dinâmica geral; é dessa ordem dinâmica que emanam, em seguida, consoantes predisposições hereditárias e circunstanciais especiais do meio ou do indivíduo, as localizações anatômicas acompanhadas de uma série de sintomas particulares, cuja evolução mais ou menos idêntica em vários indivíduos, dá o nome às várias formas de moléstias ou espécies mórbidas.
As lesões anatômicas, que ordinariamente as acompanham, não são senão produtos ou efeitos secundários do desarranjo geral primário da vitalidade, invisível e intangível e, somente revelado por sensações e funções alteradas.
A moléstia é geral: não há, pois, moléstias mentais e moléstias corporais, em toda moléstia, alma e corpo são solidários. O que há, na realidade, são formas da moléstia em que, como na loucura, as perturbações da alma predominam no conjunto mórbido e outras em que, como na disenteria, as perturbações intestinais predominam no quadro sintomático. Não há moléstias gerais e moléstias locais.
Toda moléstia é, necessariamente, geral, ela afeta todo o organismo, apenas quando acompanhada de lesões orgânicas, diz-se que uma moléstia é com localização anatômica, ou moléstia localizada. No conjunto dos sintomas que caracteriza uma dada espécie mórbida e pelo qual esta se faz conhecida aos nossos sentidos, há sintomas secundários que variam de um caso para outro da mesma moléstia, variação esta que determina o que se chama ´forma clínica´.
Independentemente das formas clínicas as moléstias apresentam diferenças em cada indivíduo, o que faz com que se diga que só há doentes, não há moléstias. É que as reações do organismo, que constituem a moléstia, devem forçosamente variar com a idade, o sexo, o temperamento, as taras, os hábitos, a profissão, o clima, a raça, o meio social., cujo conjunto forma a individualização normal de cada paciente.
Portanto, a moléstia deve, em cada caso individual, apresentar uma feição diferente, ainda que conservando, na essência, seus caracteres fundamentais. Desta forma, nos encontraremos perante indivíduos reagindo por suas próprias forças contra o mal estabelecido, e como essas forças variam de um a outro doente, assim também variam os casos individuais da mesma moléstia ou forma clínica da moléstia.
Significado Evolutivo da Doença
A medicina psico-espiritual se baseia em alguns conceitos e leis fundamentais:
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A verdadeira natureza do homem é espiritual. É ele, de fato, uma centelha divina que se exprime por meio de uma forma;
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A doença deriva de uma desarmonia entre a centelha divina (o Si) e a sua forma de expressão (personalidade);
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Isso acontece porque o homem vive em estado de inconsciência e ignorância com relação à sua natureza real e se identifica com a forma;
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Tanto a centelha divina (o Si) como a forma (personalidade) são agregados de energias (de diferentes níveis vibratórios);
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O estado de inconsciência em que o homem vive conduz à utilização errônea de tais energias: a partir daí, surge a desarmonia e, conseqüentemente, a doença;
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Os dois principais erros na utilização das energia são:
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Utilização excessiva (sobretudo das energias inferiores) provocada pela falta de domínio, o que leva à congestão;
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Repressão ou inutilização das energias, o que leva à inibição.
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Todas as doenças, portanto, podem ser subdivididas em dois grandes grupos:
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Doenças provocadas por congestão;
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Doenças provocadas por inibição.
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As causas das doenças podem ser:
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Cármicas (coletivas e individuais), isto é, derivadas de existências passadas;
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Psicológicas (isto é, derivadas da existência atual);
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Evolutivas (isto é, devidas à purificação e à transferência das energias de um centro inferior para outro superior).
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A constituição oculta do homem demonstra que as energias de que se compõe a forma de expressão do Si têm também origem espiritual e devem, portanto, cedo ou tarde, retornar a essa fonte, através de um processo de transformação e sublimação, não sem dificuldades e crises, as quais podem se exprimir através de doença física ou psíquica;
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Quanto mais o homem se aproxima da revelação de sua verdadeira natureza, mais se intensifica o processo de transformação e transferência de energias, por isso as crises e os distúrbios, tanto físicos como psíquicos, acentuam-se.
Do ponto de vista esotérico, portanto, a doença não é considerada apenas de um ponto de vista negativo, mas também positivo, pois é o sinal e a manifestação da presença, no homem, de um ´movimento´ evolutivo e a expressão simbólica de uma luta entre o impulso ascensional da centelha divina e a resistência da matéria em que esta centelha se acha aprisionada.
Podemos dizer que a doença, do ponto de vista espiritual, é indício de progresso, sinal de abandono da identificação passiva com a forma material, e que a consciência começa a despertar e a pressionar para se manifestar. Os primitivos, os homens pouco evoluídos, completamente identificados com o corpo, quase sempre desfrutam de boa saúde, pois há neles um estado de ´harmonia´, mesmo que a nível material, inexistindo conflitos, tormentos e crises.
No livro A cura esotérica, de A.A. Bailey, lemos: ´A imunidade aos males que afligem o homem não é por si só um sinal de superioridade espiritual. Ao contrário, pode ser indício daquilo que um dos Mestres descreveu como o fundo do egoísmo e da satisfação de si ´.
Todos aqueles que, possuindo uma alma sincera e motivação pura, aspiram a se conhecer, a encontrar a Verdade e a realizar a sua verdadeira natureza, podem se julgar ´aspirantes espirituais´, achando-se, portanto, no período preparatório para o despertar da consciência do Si. Portanto, podem sofrer crises, conflitos e mal-estares mais ou menos graves, devidos à gradativa penetração da nova consciência espiritual, e à tentativa por parte do Si de tomar posse dos seus veículos para imprimir assim um novo ritmo às energias da personalidade.
O homem, em sua presente condição é incompleto, imperfeito. É um ser transitório, que se prepara para tornar-se realmente humano, sendo ele próprio ´o laboratório vivo e pensante onde a Natureza quer, com a sua colaboração consciente, elaborar o super-homem...´ (De A Vida divina, de Sri Aurobindo).
Esta posição de transição constitui, por um lado, uma vantagem, e por outro um perigo e uma dificuldade, porque pode acontecer (como de fato inevitavelmente acontece) que ele inicialmente se identifique com a sua natureza animal e não com a divina, e construa para si uma consciência falsa, condicionada e limitada, feita de hábitos e automatismos, que escurece e dificulta a penetração da ´verdadeira´ consciência, a do seu Si divino.
Eis por que sempre ocorre atrito, dor, luta e mal-estar. Há uma contínua tensão entre duas tendências opostas, entre dois pólos, cada qual com características e manifestações divinas. Um deles, o pólo ´matéria´, é caracterizado pela inércia, pela tendência a conservar, manter, adaptar-se a um determinado estágio, enquanto o outro, o pólo ´espiritual´, é dinâmico, livre, em contínuo movimento e ascensão...
A certa altura de seu caminho evolutivo, o homem se torna consciente desta sua situação dual e almeja sair dela: é o momento mais importante mas também o mais delicado e perigoso do seu amadurecimento, pois deve ultrapassar conscientemente o conflito e permanecer firme, numa posição de espectador sereno e neutro, a fim de harmonizar os dois pólos. Não há como evitar o atrito, não há como se esquivar do sofrimento, mas pode-se tornar a crise produtiva e fazer com que dela brote a luz de uma nova consciência. É como o sofrimento de um parto, que a mãe deve vencer se deseja dar à luz seu filho, e que no entanto pode ser alegre, na consciência do evento maravilhoso que está para acontecer.
Assim, o aspirante espiritual, isto é, aquele que começa a sentir a necessidade de reencontrar a sua realidade, de entender o mistério da vida, que percebe o significado profundo que há por trás de tudo o que acontece, deveria enfrentar comedidamente os seus problemas, as suas crises, as suas lutas internas com ânimo forte e sereno, com o intuito de entender o que se passa em seu interior, quais as forças que se acham em jogo, e assim favorecer a sua expressão e transformação sem se opor ao impulso ascensional da consciência espiritual latente, para que não se produzam mal-estares, doenças e sofrimentos.
Às vezes acontece existir em nós um grau de maturidade espiritual maior do que percebe a nossa consciência ordinária, devido talvez a alguma resistência, a um obstáculo, a uma recusa em aceitar a nossa verdadeira missão evolutiva, a obedecer à vontade de nosso Si. Formou-se aquilo que Sri Aurobindo chama ´o nó de obstinação do ego´ (eu inferior), muito difícil de superar, pois ele julga ter de renunciar ao seu domínio, de ter de morrer, e se revolta.
De certa forma, é verdade que ao emergir a verdadeira consciência do Si, a falsa consciência da personalidade desaparece ou é subjugada. Mas isso não significa ´morte´ ou aniquilação, somente reorientação e transformação, pois nada pode morrer, muito menos as energias vitais e dinâmicas que compõem os veículos pessoais, as quais, mesmo rebaixadas e desviadas, são de origem divina e têm a sua justa função a desempenhar.
Portanto, não se trata de ´renúncia´ mas de correta utilização; não se trata de fim, mas de um novo começo; não se trata de sofrer, mas antes de encontrar, enfim, a verdadeira alegria. Não se deve esquecer que a característica do Espírito é a alegria: ele é definido como ´Sat-Chit-Ananda´, isto é, ´Existência-Consciência-Alegria´. O sofrimento deriva de uma falta de consciência, que faz com que nos apeguemos ao que é limitado, obscuro, relativo e separado do Todo.
Portanto, analisando as crises, as lutas, os sofrimentos e as doenças eventuais que precedem e preparam o despertar da consciência do Si, levamos em consideração o seu verdadeiro significado e o seu objetivo final, a fim de compreender o seu simbolismo e a sua mensagem, e, enfim, contribuir para a sua dissolução positiva de maneira mais rápida e prática, extraindo disto todo o ensinamento oculto.